Caso Real, reality show, Europa
Caso Real, reality show, Europa. Depois da saída do Thiago e do Lucas e da entrada do James, voltamos a ser um trio.
Tínhamos músicos para acompanhar a gente na trajetória. É aí que entra a figura do Fredi Bessa, um grande guitarrista e amigo, que tem sua carreira solo e acompanha outros artistas. Conheci o Fredi nos corredores da Marquise 51, com a sua banda de rock-jazz, o Sargento Malagueta. Estávamos completos, junto com o Fernando Spillari e o Juba Cardoso no violão e guitarra. Tínhamos os guerreiros, estávamos prontos pra batalha e essa formação alternava conforme o formato do show e a agenda dos músicos.
O lançamento do disco Caso Real foi um sucesso, com o Teatro do Sesc lotado em Porto Alegre. O disco saiu pelo selo Loop Discos e no show tivemos participações dos ex-integrantes da banda e amigos que ajudaram a construir a nossa carreira até então. Foi incrível. Reunimos pessoas de vários eixos da cultura naquela noite.
Foi o começo de um reconhecimento maior na cena underground do Brasil. Todas nossas músicas nos shows são cantadas a plenos pulmões pelo público e canções como “Mergulho”, “Bercy”, “Domitila” e “Amantes” viraram hits indie. Cena underground é muito curioso, pq em um lugar tu é muito conhecido e, em outros, ninguém faz a menor ideia de quem tu é.
Abrimos a Turnê Caso Real com o convite pra tocar no aniversário de 456 anos da cidade de São Paulo, no Solar da Marquesa. Fomos a primeira banda a fazer um show em um cemitério brasileiro, no Cemitério da Consolação, em São Paulo, onde está sepultada a Domitila. Recebemos muito apoio de fãs, amigos, muitas dessas coisas aconteceram depois que conhecemos o Paulo Rezzutti, um grande ser humano, autor dos livros sobre a Domitila e D. Pedro I. Tocamos em muitas cidades, gravamos o programa Showlivre, em que a gente sempre quis tocar. Foi incrível mesmo, mas o ano de 2016 prometia ainda muito mais.
THE GAUCHOS
Eu apresentava um programa web de receitas caseiras junto com meu amigo Adelino Bilhalva, o Cozinheiro Amador. Fomos parar em um reality show da TV Record, o Batalha dos Cozinheiros, apresentado pelo Cake Boss Buddy Valastro. Fiquei esperançoso, afinal, se conseguíssemos ficar no ar por um período, eu poderia tornar a Lítera mais conhecida, aumentaria o nosso alcance, estávamos feitos! Tratamos urgentemente de contratar uma assessoria de imprensa pra ajudar a potencializar nosso nome.
Fizemos um novo empréstimo, de 15 mil reais. Já estávamos devendo o disco, a prensagem do disco, nossas dívidas – só as desse período – já passavam de 50 mil reais. Ainda que tivéssemos bons shows, não estávamos ganhando o suficiente para pagar as contas e ter lucro. Muitos dos shows mal pagavam nossos custos, mas a gente entendia que estava em uma crescente. Era um investimento importante, precisávamos dar esse passo adiante.
O que parecia impossível, aconteceu: vencemos o programa que ficou mais de 3 meses no ar em rede nacional e distribuição mundial. Era surreal! Naquele período, junto com o Adelino, fiquei muito famoso e conhecido como “O melhor cozinheiro amador do Brasil”. Mas a Lítera, não.
A banda seguia no underground e ralando muito. Até consegui entrevistas como na revista Caras, onde eu sempre tentava falar da banda, mas parece que o público não tinha interesse de ouvir o que eu cantava. Se não fosse pra falar de comida ou do Buddy, não havia interesse da imprensa. Houve um momento de frustração, pois criei uma expectativa de que a banda ganharia mais notoriedade, o que acabou não acontecendo. Me senti um tanto mal, eu tinha prometido que daria essa alegria pra todos que tinham apostado na gente, mas não consegui. Usamos todo o prêmio pra pagar as dívidas, zeramos as mais antigas e seguimos com algumas mais recentes em aberto.
Eu andava nas ruas e as pessoas falavam comigo com se eu fosse o novo milionário. Como se a Lítera tivesse agora muito dinheiro, tivesse “bala na agulha”, mas isso não era verdade. A banda não teve nada de beneficio dessa fama midiática, e logo isso mexeu muito com a minha cabeça, foi uma pressão muito grande e eu não soube lidar. Essa tal fama traz muita gente bacana, mas também muitas pessoas mal intencionadas. De primeira a gente nunca sabe quem são.
No final daquele ano eu fiquei muito mal, tive uma depressão profunda, fiquei dois meses em casa sem sair pra quase nada. Tentei ao máximo manter as aparências. Uma pessoa muito importante nesse processo de manter os pés no chão e se preparar para o que viria de ruim com tudo isso, foi a Dedé Ribeiro. A experiência, delicadeza de observar atenta as nuances do mundo, me salvaram e comecei a me reconhecer.
EX-PARTICIPANTE DE REALITY SHOW
Passada a febre, o sucesso relâmpago de uma celebridade instantânea de reality show, segui com a Lítera, como sempre foi. A frustração de não ter recebido atenção das pessoas quando tentei mostrar o que fazia meu coração bater, já estava mais resignada em mim.
No ano seguinte, mais um acontecimento surreal: recebemos um convite da Casa da Música da cidade do Porto, em Portugal, pra fechar o Festival de Verão daquele ano. Era a chave de ouro pra fechar nossa turnê. Se a banda começou por onde a Domitila viveu e morreu, encerrar onde D. Pedro I foi morrer, seria simplesmente incrível. Era um ciclo perfeito. Tínhamos ainda shows em Lisboa e na volta ao Brasil mais alguns compromissos no Rio Grande do Sul e São Paulo, mas consideraríamos esse show no Porto como um encerramento simbólico.
OLHA ONDE A GENTE CHEGOU
Tínhamos um cachê bem razoável pra fazer o show, em torno de 800 euros no Porto e mais 3 shows em Lisboa e Paris em que dependíamos da entrada de pagantes. Só que as passagens em alta temporada pra Europa estavam caríssimas, então fizemos um show em Porto Alegre pra arrecadar essa grana e, apesar dos esforços do nosso pequeno grande grupo de fãs, não conseguimos tudo o que precisávamos.
Tínhamos um custo total de passagens aéreas, hospedagens, deslocamentos internos e alimentação próximo a 40 mil reais, e conseguimos arrecadar 12 mil reais. Ficou muito em cima da hora para comprar as passagens, que foram 80% da receita. Ainda tinha a correria de tirar os passaportes, enfim… ir era importante, tudo poderia acontecer durante e depois dessa viagem.
Fomos com o dinheiro contadinho, cada dia era uma vitória, e deu tudo certo. Eu estava muito cansado e passei metade da gig com 12 aftas gigantes na boca. Mas os shows foram ótimos, éramos crianças. Mereciamos aquilo, depois de passar tudo que a gente tinha passado, era por direito aquela paisagem, tocar em lugares históricos e pra pessoas de outros idiomas, foi surreal, com toda certeza ainda não sabemos como mensurar o que foi tudo isso.
Era inevitável olhar pro Rio Douro e pro Rio Sena e não lembrar do Valão do Sarandi. “Olha onde a gente chegou.”