E se todo mundo perceber que eu sou uma…
E se todo mundo perceber que eu sou uma farsa? Estávamos nos preparando para gravar nosso primeiro disco. Mas só tínhamos 1 música pronta. E que foi resgatada lá da época da Absolon: “Museu”, minha e do Rodrigo. Todas as outras músicas nascem do meu novo parceiro de composição, o Thiago. Ele tinha várias músicas sem letra, então foi muito fácil e rápido. Eu dizia que éramos Paul e Lennon do Sarandi (pelo menos era o que eu idealizava na minha cabeça).
Que ótimo, tínhamos 11 canções! Enfim, depois de muitos anos de espera, podemos gravar!
Com a nova formação sem baixista, Rodrigo e Thiago se revezavam nas gravações do baixo. A gravação dos instrumentos de cordas foram todas feitas no “home studio” que montamos na casa do Rodrigo, apenas a bateria e voz foram gravadas fora. Eu tive uma grande crise de ansiedade e depressão na fase da primeira gravação de voz. Tinha medo de não dar conta, tinha medo da crítica. Eram as primeiras vezes em que eu ouvia minha voz cantada gravada num som mais limpo, organizado… e não gostei do que ouvi (aliás, nunca gostei de me ouvir). As críticas ao meu vocal eram recorrentes nas primeiras audições. Sempre ouvia que a banda era boa, mas a voz deixava a desejar, faltava emoção, brilho… e afinação nem se fala.
EU NÃO SOU CANTOR
Esse é um ponto importante de virada na minha vida: conheci o Iuri Sanson, vocalista da banda de metal Hibria. Era a melhor pessoa que eu poderia conhecer naquele momento. Um ser totalmente dedicado, simples, com uma linguagem clara, motivadora e de um talento excepcional. Virou um grande amigo e produtor vocal. Ajudou a desenvolver minha personalidade de voz, a me expressar e por pra fora tudo que estava preso. Era muito mais do que técnica, era emocional. Soube me preparar para o que estava por vir. Um cantor está sempre em desenvolvimento e aprimoração, mas sem essa base não sei dizer como estaria hoje. Ele me ensinou que cantar bonito muita gente canta, mas cantar com o coração são poucos.
Eu poderia ter desistido ali, cheguei a pensar nisso. Nada até então tinha me colocado tanto pavor como registar a minha voz pra sempre e todo mundo perceber que eu era uma farsa. Eu não era cantor. Fiquei seis meses me preparando com o Iuri, e ele me acompanhou como um irmão mais velho em todos os dias de gravação, me incentivou em cada nota boa. Foram incríveis todos os conselhos em forma de conversa nos intervalos, nas idas e nas vindas das gravações. Essa história merece um capítulo só pra ela, vou fazer isso um dia dando o devido mérito.
UM POUCO DE CADA DIA
Prestes a lançar o disco, o Rodrigo conheceu o Lucas num site de bandas e ele entrou pra fazer um teste sem compromisso. Acabou ficando oficialmente e a banda volta a ser um quarteto com seu primeiro álbum independente gravado, o “Um pouco de cada dia”, em 2009. As letras foram todas escritas por mim, com exceção da música “Saudade”, canção instrumental do Thiago. Ele chegou a me dar ela pra escrever uma letra, falou que era uma canção pro pai dele, e tudo que eu fiz foi por o nome. Disse que ela já estava pronta, pra deixar assim. E assim ficou.
As letras do disco descrevem minha relação familiar, perda de amigos e um recém término de namoro que me levaram pra estatística da família – passei a tomar lithium diariamente. Não consegui escapar. O dia a dia daquelas relações e minhas músicas autobiográficas se transformaram em uma ideia conceitual com a ajuda dos guris. O disco abre com a frase “no fim do mês, conta comigo… ” e termina com “…pra ver brilhar o nosso lar”.
Foi um alívio e uma grande emoção quando saíram as primeiras críticas. Todas muito positivas. Com certeza o disco marcava o início de uma nova etapa. O álbum foi escolhido como “melhor lançamento de 2009” pela audiência do blog da RBS, afiliada da Globo aqui na região sul. Depois que gravei o disco, alguns medos foram amenizados, recebi muitos elogios sobre a minha voz. Mesmo assim não estava muito convencido, me preocupava mais com as críticas negativas do que com os aplausos. O que as pessoas mais falavam e elogiavam eram as letras. Todo o desdobramento do lançamento desse disco me marcou de um jeito permanente.